Monday, September 10, 2007

Luiz Pacheco na K


Luiz Pacheco na revista K, n.º 22 - Julho de 1992, entrevistado por Carlos Quevedo e Rui Zink, referindo-se Fernando Ribeiro de Mello e aos processos que apanhou por conta das suas aventuras nas Edições Afrodite. Agradecimento ao Funcionário Cansado, de onde retirámos as partes da entrevista e a imagem.


K - O que é um libertino?

LP- O libertino para mim, é mais fácil de definir pela negativa. A libertinagem não é o medo, não é a devassidão, não é a tristeza. É o ateu progressista. É preciso não esquecer que o Marquês de Sade, depois de ter saído da Bastilha, pertenceu a um comité do povo, e nesse comité do povo ele fez uma acção humana, que foi salvar a sogra que o tinha perseguido durante 40 anos ou coisa que o valha. Ele não mandou cortar a cabeça da sogra, mas a sogra merecia.

K - Porque é que o libertino não é um devasso?

LP - O devasso é o gajo que não tem regras, é o gajo que vai a todas, é um bocadinho o Ribeiro de Mello, benza-o Deus, que já está no outro mundo. A Natália Correia é uma devassa, vocês ponham isso que ela fica toda zangada, mas ela é uma devassa. Por exemplo, ela foi à estreia, não, ela não foi à estreia mas foi lá ver a Comunidade e ela diz: «Afinal de contas o Luiz Pacheco é um pater famílias, a libertina sou eu». Eu, se estivesse lá dizia: «Ó sua maluca, você não é uma libertina, você é uma devassa», é uma estragadona que não respeita pai nem mãe, vai meter-se com o irmão de uma mulher minha, com um tio deste, quando eu estava preso no Limoeiro. Ela meteu-se com uma mulher minha. Quer dizer, abusou da situação de eu estar preso para aproveitar uma rapariga que estava lá em casa por caridade. E depois, quando eu saí, claro que fiz uma guerra, ataquei uma mulher dela, à má fila, para ela saber o que é bom. Portanto vocês têm uma noção de como é o libertino, eu tenho esta que é feita por negativas. O libertino faz da sua vida um espectáculo; ora este texto é um espectáculo, é a tal noção do cinema verité, quer dizer, vai mostrando o libertino a fazer aquelas maluqueiras todas, com o vinho verde, que é um vinho que não dá muita perturbação. Vai mostrando os fracassos, vai-se confessando, mas também há um certo gozo masoquista disso. O que não é tristeza.

(...)

K -Nunca saiu do país?

LP -Estive em Itália só uma vez, ia fugir para o Egipto. Em relação a esses tipos, o Cardoso Pires, o Saramago, o Salazar Sampaio, eu sou um atraso de vida, porque sou um gajo de 1800 e tal 1900. Olha, nunca andei de avião. Estive em Roma e fui num comboio e vim noutro. Eu queria ver se ia para o Egipto para fugir a uns processos, porque eu tive mais processos-crime. Cheguei a ter cinco processos ao mesmo tempo: o processo do Marquês de Sade, o processo da Natália Correia com a Antologia, o processo da mãe deste, da menor, o processo da dona de casa…